segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Carta Capital - Ministério da Defesa.

Poder civil sobre militares

Mariana Jungmann

Brasília - A presidenta Dilma Rousseff acertou na escolha do ex-chanceler Celso Amorim para ocupar a vaga deixada por Nelson Jobim no Ministério da Defesa, segundo o analista político Creomar de Souza. Na opinião dele, Amorim deverá consolidar o controle civil sobre as atividades militares e mostrar traquejo para lidar com as dificuldades do cargo.

“Era a pessoa certa, no lugar certo e na hora certa”, avalia Souza, que também é professor de Relações Internacionais da Faculdade Ibmec em Brasília. Ele explica que o Brasil não tem tradição de subordinação militar ao poder civil e que o Ministério da Defesa foi criado com dificuldades durante o governo de Fernando Henrique Cardoso justamente para marcar a nova fase da democracia brasileira.

No entanto, para o professor, o objetivo só foi alcançado quando Jobim assumiu a pasta. O ex-ministro tinha perfil compatível com o modus operandi militar, com personalidade forte e pouca flexibilidade, explicou.

“Com Jobim nós tivemos pela primeira vez alguém que era ministro e que conseguiu impor uma agenda para os militares. Só que chegou um momento em que a manutenção do ministro era insustentável."

Diante da situação, de acordo com Souza, colocar o vice-presidente da República para acumular as funções - como fez o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva com José Alencar em seu primeiro mandato - seria um “retrocesso”.

“Essa fase do vice na Defesa já passou. O ministério agora é como os outros, exige alguém com dedicação exclusiva e não há mais motivo para colocar uma figura emblemática lá."

Para o analista político, a hierarquia militar não permite questionamentos quanto à escolha da presidenta, que é também a chefe das Forças Armadas, mas as resistências apareceriam com qualquer nome em função da dificuldade dos militares em lidarem com o comando civil.

Além disso, Souza reconhece que militares e diplomatas têm “modelos de formação e de pensar o Brasil totalmente diferentes”, mas acredita que o nome de Celso Amorim foi a opção correta de Dilma.

“Ele [Celso Amorim] vem para reafirmar que o Brasil é uma democracia consolidada. E nas democracias consolidadas os militares estão subordinados ao poder civil."

Apesar disso, o professor acredita que ainda é cedo para saber se o novo ministro vai conseguir dar continuidade à agenda iniciada por Jobim, que inclui temas como a Política de Defesa Nacional e a Estratégia Nacional de Defesa.

“Ainda é cedo para mensurar a recepção que ele terá. Acredito que o ministro Amorim vai procurar primeiro saber onde está pisando."

Sites de Informação em Relações Internacionais.

Mundorama - Iniciativa de Divulgação Científica em Relações Internacionais
Site: http://www.mundorama.net
Twitter: @mundoramanet

Instituto Brasileiro de Relações Internacionais
Site: http://www.ibri-rbpi.org
Twitter: @ibri_rbpi

Revista Brasileira de Política Internacional
Site: http://www.ibri-rbpi.org

Boletim Meridiano 47
Site: http://www.meridiano47.info

domingo, 7 de agosto de 2011

Estadão - Artigo de Paul Krugman

A Standard & Poor's e o rebaixamento dos Estados Unidos

Paul Krugman - O Estado de S.Paulo

Pois é, a Standard & Poor"s fez o que ameaçava fazer: rebaixou o rating dos Estados Unidos. É uma situação estranha.

Por um lado, agora justifica-se a afirmação de que a loucura da direita tornou os Estados Unidos uma nação fundamentalmente doente. Porque, de fato, é a loucura da direita: se não fosse o radicalismo dos republicanos, sempre contrários a impostos, seria possível chegar, sem nenhum problema, a um acordo que garantiria a solvência a longo prazo.

Por outro lado, é difícil imaginar uma entidade menos qualificada para passar um julgamento sobre o nosso país do que as agências de rating. Então as pessoas que classificaram os títulos respaldados em empréstimos subprime agora se declaram os juízes da política fiscal? É mesmo? E, para a coisa ficar mais perfeita, ficou claro que a S&P errou nos cálculos em US$ 2 trilhões; depois de muitas discussões reconheceu - e rebaixou a classificação. Mais do que isso, tudo o que já ouvi sobre as exigências da S&P indica que a agência está falando absurdos a respeito da situação fiscal dos EUA. Ela sugeriu que o rebaixamento se deu por causa do montante da redução do déficit que havia sido negociada para a próxima década, e aparentemente acenou com o mágico número de US$ 4 trilhões.

Entretanto, a solvência dos EUA não depende do que acontece a curto e até mesmo a médio prazo: mais de U$ 1 trilhão de dívidas representa um aumento de apenas uma fração de um ponto percentual do Produto Interno Bruto (PIB) aos custos dos juros futuros. Portanto, U$ 2 trilhões a mais ou a menos não têm grande significado a longo prazo. O que importa é a perspectiva a prazo mais longo, que, por sua vez, depende em grande parte dos custos da saúde.

Então, do que é que a S&P estava falando?

Supostamente, ela possuía alguma teoria segundo a qual a restrição agora é um indicador do futuro - mas não há nenhuma boa razão para se acreditar nesta teoria, e seguramente a S&P não tem nenhuma autoridade para fazer esse tipo de vago julgamento político.Em suma, a S&P fez uma asneira - e, depois da débâcle das hipotecas, não tem mais esse direito. É um escândalo - não porque os EUA estejam numa boa situação, mas porque estas pessoas não têm condições de julgar.

É COLUNISTA DO NEW YORK TIMES

quinta-feira, 28 de julho de 2011

Estadão - Coluna de Raquel Landim

É hora de se acostumar a exportar sem o SGP

26 de julho de 2011 | 14h39

Raquel Landim

É hora dos exportadores brasileiros se acostumarem a sobreviver sem o Sistema Geral de Preferências (SGP) dos países ricos. A tarefa não vai ser fácil, mas a exclusão do Brasil desses programas de benefícios é só uma questão de tempo.

O SGP surgiu em 1947 e foi adotado por países desenvolvidos, como Estados Unidos, União Europeia, Japão ou Suíça. Pelo sistema, os países pobres podem exportar alguns produtos para esses mercados sem pagar tarifas de importação. Todos os parâmetros sao decididos pelas nações que oferecem o SGP: listas de produtos e de países, período de vigência, tamanho da queda das tarifas.

Trata-se de um sistema de benefícios unilateral, que pode ser revogado a qualquer momento. Não é de hoje que Estados Unidos e União Europeia ameaçam retirar o Brasil de seus SGPs, argumentam que o País não pode mais ser considerado uma nação em desenvolvimento. A pressão só fez aumentar com a crise global, que reduz a necessidade dos países ricos por importações.

Os SGP são frequentemente utilizados como instrumento de barganha. Os americanos já ameaçaram excluir o Brasil pelo mais diferentes motivos, como sua batalha pelo fim dos subsídios agrícolas na Organização Mundial de Comércio (OMC) ou até pelo o caso do garoto Sean Goldman, cuja guarda era disputada pelo pai americano e pela família da mãe brasileira, já falecida. Os europeus também usam o SGP para forçar o Brasil a aceitar um acordo de livre comércio Mercosul – UE.

Nos Estados Unidos, o SGP expirou no final do ano e até agora não foi renovado, porque a agenda legislativa em Washington está totalmente tomada por debates mais importantes, como a elevação do teto da dívida do país. Levantamento da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e da Coalizão da Indústria Brasileira em Washington mostram que os exportadores brasileiros estão perdendo negócios, com quedas nas exportações neste primeiro semestre que variam entre 18% e 97% dependendo do setor.

Lobistas brasileiros que acompanham o assunto dizem que já existe um pré-acordo entre Democratas e Republicanos para renovar o SGP – sem excluir o Brasil – até 2013. O assunto está em análise na Casa Branca e pode voltar ao Congresso a qualquer momento, mas ainda há receio que o SGP seja atrelado a temas mais complicados, como o tratado de livre comércio EUA-Colômbia ou o acordo que prevê concessões para as empresas americanas em casos de abertura comercial.

Se o melhor cenário prevalecer, os benefícios vão valer por mais um ano e meio. E depois? “Todo ano é essa mesma ladainha para renovar o SGP”, disse ao blog Mário Branco, gerente de comércio exterior da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee). É mesmo. Só que a pressão se torna cada vez mais forte. A Europa anunciou oficialmente que vai excluir o Brasil do SGP no final do ano. Para os Estados Unidos seguirem o mesmo caminho, é só uma questão de tempo.

O SGP americano já foi muito mais importante para as exportações brasileiras. Em 1997, 25% do que vendíamos para os EUA utilizava os benefícios do programa. No ano passado, esse porcentual caiu para 9%. Os empresários argumentam que com o atual patamar do câmbio qualquer benefício é importante para a competividade do produto brasileiro. Pode até ser. Mas está longe de ser o ideal.

O Brasil precisa resolver seus problemas estruturais, como a alta carga tributária e a infraestrutura logística precária, ao invés de depender da boa-vontade dos outros para exportar.

terça-feira, 19 de julho de 2011

Estadão - Artigo de Larry Flint

O povo versus Murdoch

Magnata australiano ignorou o direito à privacidade e colocou os que desfrutam da liberdade de expressão em grave risco

Larry Flynt, The Washington Post - O Estado de S.Paulo

Um dos poucos valores que Rupert Murdoch e eu compartilhamos é a importância de uma imprensa livre. Concordamos que este é um direito irrefutável, especialmente num período em que poucas liberdades genuínas ainda existem nos EUA. Reconhecemos que, se a mídia perder seu direito de livre expressão, perderemos tudo. E, talvez mais importante, sabemos que nesse esforço para proteger essa liberdade, os limites têm de ser ampliados.

Mas divergimos quanto à maneira como ampliamos esses limites. Eu o faço publicando matérias controvertidas e pagando a pessoas que estão dispostas a ir mais longe e expor a hipocrisia política. Os subordinados de Murdoch ultrapassaram os limites, com ações antiéticas e criminosas: grampos de telefones, subornos, um comportamento criminoso coercivo, traindo a confiança dos leitores. Se os delitos atribuídos à News Corporation são verdadeiros, a empresa de Murdoch está disposta não só a ultrapassar os limites, mas acabar com eles.

Não podemos desfrutar da liberdade e dos benefícios de uma imprensa livre ignorando a privacidade dos indivíduos. Como dirigentes de conglomerados jornalísticos, temos a responsabilidade de manter e respeitar este limite. Embora Murdoch compreenda o significado do que fazemos usando como pretexto a livre expressão, ele pode não ter entendido a responsabilidade que uma publicação deve ter.

As empresas de Murdoch divulgam sistematicamente reportagens sobre pessoas que não deram permissão para ter suas vidas expostas na mídia - e esta é só a ponta do iceberg. Os funcionários da News Corporation teriam contratado criminosos conhecidos para obter informações particulares sobre o ex-premiê britânico Gordon Brown, quando seu filho foi diagnosticado com fibrose cística. Também teriam contratado investigadores que grampearam telefones de vítimas dos atentados do 11 de Setembro nos EUA e de 2005 em Londres.

Portanto, é justo que Murdoch tenha sido obrigado a fechar o tabloide News of the World e a abandonar sua proposta de compra da rede de TV por satélite British Sky Broadcasting.

Independentemente do quão ofensiva ou escabrosa as pessoas possam considerar a revista Hustler, e outras publicações sob minha responsabilidade, o fato é que ninguém aparece nas suas páginas sem ser consultado e ter concordado com isso. Sim, pago para quem queira denunciar políticos hipócritas - e um desses casos, em 1998, resultou na renúncia de Bob Livingston, parlamentar republicano da Louisiana que votou a favor do impeachment do presidente Bill Clinton, apesar dos próprios casos extraconjugais. Meu foco não são pessoas inocentes, mas aquelas que praticam o oposto do que pregam em público.

Quase que diariamente, e de maneiras que o público no geral não consegue reconhecer, nosso direito à privacidade vem desaparecendo.

Nossos líderes políticos permitem que empresas como Google e Facebook violem continuamente esse direito. Ambas servem como minas de dados, vendendo informação sobre seus usuários. O Facebook, usando o artifício das configurações para resguardar a privacidade individual, simplesmente acabou com ela. O governo necessita voltar às suas raízes: proteger a intimidade dos seus cidadãos, ao mesmo tempo encorajando as liberdades individuais.

Limite. A liberdade de imprensa e o direito à privacidade não devem ser beligerantes. As pessoas conferiram aos membros da mídia o dever e a responsabilidade de prestar informação. Como editores, precisamos saber qual é o limite, ampliá-lo, mas jamais ultrapassá-lo.

Se as alegações forem verdadeiras, Murdoch não só ultrapassou esse limite - ele o deletou. E ao fazer isso, colocou todos nós que desfrutamos da liberdade de expressão em grave risco. Somente quando os leitores acreditarem que o material publicado foi obtido honestamente é que uma imprensa livre poderá continuar sendo a força propulsora na preservação da nossa democracia. / TRADUÇÃO DE TEREZINHA MARTINO

É PROPRIETÁRIO DA LARRY FLYNT PUBLICATIONS