sábado, 11 de dezembro de 2010

As perspectivas da esquerda no Brasil

por Creomar Lima Carvalho de Souza e Leandro Freitas Couto

As eleições desse ano apontam elementos importantes para a reflexão quanto ao arranjo nacional de forças dos partidos políticos para os próximos anos. Esse artigo pretende ser uma reflexão acerca das composições políticas que irão afligir a base de sustentação do governo, com destaque aos chamados partidos de esquerda.

O resultado das eleições deu ao Partido dos Trabalhadores maior força na sua presença já hegemônica no campo político da esquerda nacional. Todavia, também se pode afirmar que, pelas alianças construídas e consolidadas durante o governo Lula e no processo eleitoral que acaba se encerrar, caminha para o centro, tomando parte da bandeira social-democrata que era hasteada pelo PSDB.

Ao fazer a maior bancada da Câmara e a segunda maior bancada no Senado, revezando-se com o PMDB, que fez a segunda maior bancada na Câmara e manteve a primeira no Senado, o Partido dos Trabalhadores consolida uma posição vantajosa em termos políticos nas casas do congresso. Porém, devido à própria estrutura do sistema político-partidário torna-se importante pontuar que a parceria petismo-pemedebismo tem limites de ação, a saber: a) o fato de que aliados históricos do PT podem sentir-se preteridos e assim buscarem novos espaços e b) o fato de que o PMDB é muito mais uma federação partidária do que um partido nacional.

Neste aspecto especificamente, é importante fazer a seguinte pergunta: Por quanto tempo o vice-presidente conseguirá manter seu partido unido à sua volta? Na resposta a este questionamento é importante considerar a capacidade da nova presidência de manter bons níveis de popularidade – ferramenta fundamental para ter menos resistência no congresso – e a distribuição de cargos de destaque em termos eleitorais para elementos chave do governo.

Conseguindo manter a unidade é natural que o partido do vice-presidente Michel Temer queira manter sob seu comando pastas importantes no executivo federal, e ainda que pressione para aumentar o seu quinhão na distribuição governista. Somam-se a isso os acenos que lança a setores menos radicais do DEM, que saiu enfraquecido dessa eleição, como ao prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, além da aproximação que até recentemente tentara com o ex-governador e senador eleito de Minas Gerais, Aécio Neves, e percebe-se também como natural a reação dos partidos aliados tradicionais do PT que ainda se mantêm à esquerda no espectro político partidário brasileiro, e que não cederão facilmente espaço ao PMDB.

Dentre esses, destaca-se o PSB, que, com 34 deputados, consolida-se como a segunda maior força da esquerda. Além disso, o partido elegeu seis governadores, um a mais que PT e PMDB. Destacam-se Pernambuco, Ceará e Espírito Santo, que se somam a Piauí, Amapá e Paraíba. Além disso, o partido reúne quadros de expressão nacional, como Ciro Gomes e Eduardo Campos, herdeiro político de Miguel Arraes, políticos também próximos a Aécio Neves, o que o torna também uma casa possível de receber o presidenciável, caso este realmente decida deixar as fileiras tucanas. No Senado, o PSB também aumentou sua bancada, de um para três senadores. O desafio dos socialistas, portanto, é a transição de uma postura passiva para um apoio responsável ao governo. Isto quer dizer que, naturalmente o PSB pode assumir-se como um projeto complementar e não submisso aquele construído pelo partido dos trabalhadores.

O PDT, outro partido médio de esquerda, não conseguiu eleger nenhum governador em 2010, depois de ter elegido dois, quatro anos antes. No senado, elegeu um parceiro do partido do reeleito Senador Cristovam Buarque, ficando com duas cadeiras. Aumentou em quatro o número de cadeiras na Câmara, elegendo 28 deputados federais. Apresenta um quadro estático, sem renovação de lideranças, cenário que se afirma com a não eleição do ativo deputado Brizola Neto, do Rio de Janeiro.

Da mesma forma, o PCdoB ganhou mais uma cadeira no Senado com Vanessa Grazziotin, do Amazonas, que se junta a Inácio Arruda, Senador eleito em 2006 pelo Ceará. Na Câmara, passou de 12 para 15 deputados, ficando, como o PDT, sem governos estaduais.

O PRB, ligado aos bispos evangélicos, reelegou o Senador Crivella no Rio de Janeiro, além de oito deputados federais. Por sua vez, a esquerda mais radical definha, com o PSOL tendo recebido menos de 1% dos votos na corrida presidencial, embora tenha elegido dois senadores e mantido a bancada de três deputados federais.

A um avanço do PMDB na estrutura do governo Dilma, mesmo pelo espaço já diminuto que ocupam os partidos aliados da esquerda (PSB com MCT e Secretaria de Portos, PDT com a pasta do trabalho e PCdoB com a pasta do Esporte), poderia acarretar uma retração da participação do partido da Presidenta. Duas questões passam a ser fundamentais: até onde conseguirá gerenciar as pressões de seus companheiros de partido para fazer frente a essa perda de espaço e a quantidade de mágoas a serem engolidas ou esquecidas e o preço a ser pago que será suportado para manter a parceria para 2014.

À espreita estará Aécio Neves. Caso a relação PT-PMDB caminhe para o conflito, poderá engrossar as fileiras do PMDB e sair candidato pelo partido em 2014. Caso a parceria e o governo Dilma-Temer andem bem, sua opção seria desembarcar junto aos socialistas, em busca da conformação uma terceira via, abandonando o peso da oposição mais radical tucana-demista. Por fim, se o governo caminhar para um desastre, o que me parece a alternativa menos possível, poderia disputar a candidatura no próprio PSDB.

Sua espera, no entanto, não deve se alongar. Na perspectiva de uma reforma política, a possibilidade de aglutinação de alguns desses partidos médios, PSB, PRB, PDT e PCdoB pode se viabilizar. À esquerda não deve interessar ficar nas mãos de apenas um partido, ou um líder, ainda mais quando estes estão a levando mais ao centro e torna-se o foco principal da resistência midiática. No médio prazo, é importante para esquerda construir uma opção ao PT, mas precisaria ainda buscar um nome renovado de projeção nacional. Ciro Gomes carrega a antipatia da mídia, e Eduardo Campos não têm essa projeção. Sem esse novo nome, esses partidos estarão destinados a orbitar em torno do PT, limitando as perspectivas da esquerda de defender o lulismo apenas com as armas marcadas do petismo.

* Creomar Lima Carvalho de Souza é analista político do IBMEC/DF e Leandro Freitas Couto é analista de Planejamento e orçamento e doutorando Relações Internacionais Universidade de Brasília.