domingo, 25 de dezembro de 2011

Estadão - Gaudêncio Torquato.

Narcisistas e demagogos

O convívio intenso e longo com o poder tem um poderoso efeito narcotizante. Transforma seres mortais, pessoas simples e humildes, gente com histórias iguais a de seus semelhantes, em pequenos “deuses” de um Olimpo cada vez mais povoado.

A que se deve esse tipo de distorção? À armadilha do falso retrato, da autocontemplação, que prende os homens públicos na moldura de Narciso, aquele que foi condenado pelos deuses a se apaixonar pela própria imagem.

Como conta a lenda, ele tomou-se de amores pela imagem quando se contemplava nas águas transparentes de uma fonte. Obcecado pelo reflexo, Narciso não mais se afastava da fonte, definhando ali até a morte.

Hoje, vive-se a plena era do Estado-Midiático. Como lembra Roger-Gérard Schwartzenberg, no clássico O Estado-Espetáculo, os profissionais do espetáculo e da política compartilham frequentemente as mesmas atitudes e os mesmos vezos, como se, diante de problemas de representação comparáveis, “eles reagissem recorrendo a procedimentos análogos.”

O Brasil está recheado de narcisistas, pessoas fascinadas pelo seu próprio brilho, um brilho ilusório, porque muitas perderam o poder, mas não o orgulho. Que tipo de mal os narcisistas cometem contra si mesmos e contra a sociedade?

O maior dos males é o da inação, o da inércia, o da perda do sentido de realidade. Presos no simulacro do poder, exibem um prestígio falso, que frequentemente conduz ao ócio. Aliás, praestigium, do latim, significa nada mais nada menos que artifício, ilusão, malabarismo.

Os malabaristas da política promovem a mistificação das massas, fazendo-as crer que o discurso é a ação, o verbo é a obra, a palavra é sinônimo de verdade. Muitos se transformam em dândis, com seu prazer em surpreender, espantar.

Dizia Baudelaire: “creio que existe na ação política uma certa dose de provocação, por ser preciso suscitar uma reação”.

O dândi quer chamara atenção, provocar, criar impacto. E, não raro, cai no exagero, fazendo da estética sua ação política mais forte. É useiro e vezeiro na arte do exagero. Nele, a verdade acaba mas a história tem sempre continuidade. Por conta da verborragia.

Ademais, a cultura oral é uma das tradições mais ricas de nosso país. Basta uma pequena viagem pela monumental obra do incomparável Luís da Câmara Cascudo, um potiguar boêmio, bonachão e denso, que produziu a mais fecunda e abrangente obra sobre a cultura popular brasileira.

A tradição de oralidade penetrou profundamente nas veias, mentes e corações da representação política, a ponto de se atribuir, por muito tempo, a grandeza dos homens públicos não aos projetos e feitos empreendidos, mas ao domínio do verbo no palanque ou na tribuna parlamentar.

Duas historinhas, muito conhecidas, mostram os polos do discurso tradicional da política. A primeira é a do baiano, embevecido com a retórica complicada, cheia de palavras difíceis, de seu candidato em comício numa pequena cidade interiorana. Não se cansou de bater palmas, concluindo categórico: “não entendi nada do que o homem falou, mas falou bonito; vai levar meu voto”.

A segunda historinha é a do candidato, que, arrebatado, enérgico, espumando de civismo, discorria sobre o sentido da liberdade. Argumentava que um povo livre sabe escolher os seus caminhos, seus governantes, eleger os seus vereadores, prefeitos e deputados. Para entusiasmar a multidão, levou um passarinho numa gaiola, que deveria ser solto no clímax do discurso.

No momento certo, tirou o passarinho da gaiola, e com ele na mão direita, jogou o verbo: “a liberdade é o sonho do homem, o desejo de construir seu espaço, sua vida, com orgulho, sem subserviência, sem opressão; Deus (citar Deus é sempre bom) nos deu a liberdade para fazermos dela o instrumento de nossa dignidade; quero que todos vocês, hoje, aqui e agora, comprometam-se com o ideal do homem livre. Para simbolizar esse compromisso, vamos aplaudir soltar esse passarinho, que vai ganhar o céu da liberdade”.

Ao abrir a mão, viu que esmagara o passarinho. A frustração por ter matado o bichinho acabou com a euforia e as vaias substituíram os aplausos. Foi um desastre. É sempre assim quando não se controla a emoção. Em se tratando do discurso político, a emoção mata frequentemente a razão.

Juntando-se, então, o narcisista e o demagogo, o verborrágico e o reizinho cheio de empáfia, tem-se a receita de um perfil que ainda teima em se apresentar às massas nacionais. É o encontro do ruim com o pior, de Narciso com aquela figura canhestra tão bem caracterizada por Chico Anísio, Justo Veríssimo.

E quando isso ocorre, a política volta a ser aquilo que Paul Valéry mais temia: “a arte de impedir que as pessoas cuidem do que lhes dizem respeito”.

Nesses tempos de grande influência da mídia, é bom ter cuidado, porque a espetacularização da política pode significar a ruína dos atores. Não enganam mais como antigamente; são pegos quando escondem o lixo debaixo do tapete; e flagrados quando a maquiagem procura disfarçar a deficiência do pensamento.

Mulheres e homens publicos desses nossos trópicos: reflitam, neste apagar de luzes de 2011, sobre o exercício da representação coletiva. Assumam o compromisso de trazer a verdade para a seara da política. O Estado-Espetáculo aprecia os efeitos mágicos do circo político.

Como dizia Luis XIV, “os povos gostam do espetáculo; através dele, dominamos seu espírito e seu coração”. Mas há um limite para tudo. Um dia, mais cedo ou mais tarde, o povo, cansado de ver tanto malabarismo, fará a mágica que nenhum representante gostaria de ver: mandá-lo de volta para sua casa sem o passaporte do mandato popular.



Gaudêncio Torquato, jornalista, professsor titular da USP, é consultor político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquato

sábado, 24 de dezembro de 2011

Estadão - Artigo de Olgária Martins Feres Matos

As rebeliões do efêmero

A ideologia dominante é a do novo-rico, que conhece o preço de todas as coisas, mas desconhece o seu valor

24 de dezembro de 2011 | 16h 00

Olgária Chain Feres Matos

O movimento pela descriminalização do uso da maconha, a luta contra a corrupção, a dos estudantes na USP pela retirada da Polícia Militar do câmpus universitário, dos homossexuais contra a homofobia no Brasil, correspondem à tendência neoliberal global de ocupação do espaço público - mas em um país que não responde pela qualidade da formação educacional que garantiria o fortalecimento da “vida intelectual” e do debate político. Que se pense, em particular, no movimento pela liberação da maconha, que não desenvolve reflexões sobre o sentido da disseminação de narcotizantes na sociedade de massa e do consumo, a questão da cultura do excesso, cuja exemplaridade são as festas rave e a música techno. Nos anos 80, Salvador Dalí, com todo seu surrealismo, interpelado sobre o uso de drogas, respondeu que se deveria consumi-las no máximo cinco vezes durante toda a vida. Ser Baudelaire ou Michaud, Omar Khayyam ou Benjamin não é dado a muitos.


Tiago Queiroz/AE
A dita classe A assumiu caráter predatório ao ignorar questões como transporte e educação
Já as mobilizações estudantis no Chile, ao contrário das contestações no Brasil, têm sido contra a flexibilização dos currículos escolares e a redução da carga horária nas disciplinas humanistas e formadoras, como literatura, línguas estrangeiras, história, etc., a fim de barrar a desigualdade no acesso aos bens culturais e a proliferação dos privilégios educacionais. O que manifesta a consciência de que a educação não é um serviço do qual se é consumidor, cliente, porque ela não é uma mercadoria.

Já o movimento dos homossexuais, mais politizado porque em luta contra preconceitos de que decorrem sofrimentos, não se interroga sobre a tendência pós-moderna a indiferenciações do que é por natureza assimétrico, no que diz respeito àquelas que existem entre as gerações, entre pais e filhos, professores e alunos, masculino e feminino, isto é, o mal-estar identitário no mundo contemporâneo. Quanto ao movimento pela “transparência”, tem a força da indignação, mas não questiona a corrosão do sistema parlamentar, consequência, hoje, da falência da escolaridade e da ética que a ela se vinculava quando a educação, ao menos em seus princípios fundadores, humanistas e republicanos, propunha, primordialmente, formar as crianças para fazer delas adultos mais felizes e melhores.

Auspiciada pelo dinheiro como valor hegemônico, a ideologia dominante é a do novo-rico, que conhece o preço das coisas, mas desconhece seu valor. Se, em seu primeiro espírito, o capitalismo se baseou na parcimônia e no não contraimento de dívidas e no segundo valorizou o mérito e o trabalho como “dignificante” do homem, seu estágio atual é “sem espírito”, entronizando o dinheiro como supremo valor, dinheiro que, na aceleração do tempo, induz à pressa, os indivíduos perdendo o gosto do pensamento, nada desejando aprofundar.

O próprio amálgama de diversos delitos entendidos como corrupção (favorecimentos ilícitos, informações privilegiadas, tráfico de influência, gratificações indevidas, desvio de verbas públicas, suborno, omissões por interesses próprios ou partidários, formação de cartéis), malgrado pontos em comum, atesta sua fraca conceituação. E porque é mais fácil “derrubar o tirano do que as causas da tirania”, a vigilância cidadã fica sujeita à demagogia, quando a opinião pública é direcionada por interesses dissimulados, a defesa do bem público transgredindo seus limites e invadindo a esfera privada e a da intimidade. Tais movimentos, quanto mais conceitualmente confusos, mais vulneráveis à apropriação oportunista.

Além disso, as mobilizações contemporâneas se fazem com as novas tecnologias de informação, nas quais tudo se passa “aqui e agora”. Essa temporalidade é a do efêmero, mas em sentido pós-moderno, uma vez que ele se reduz ao episódico, compensado pela visibilidade promovida pelas mídias. Sua lógica é a do espetáculo que não se vincula a qualquer fundamentação teórica, adquirindo a forma do “evento”. No passado, a vida se organizava no tempo longo e nos laços duradouros, cuja “metafísica” subjacente dizia respeito à percepção da impermanência de tudo, da lei do efêmero, da vanidade das coisas e da grandeza do instante. As manifestações públicas e ocasionais contemporâneas se constituem no âmbito de um vazio ideológico e no quadro do anti-intelectualismo do mundo moderno, o que se expressa na pseudoparticipação popular e em governos que se fazem através das mídias, pela televisão e pela propaganda.

Com reivindicações particulares voltadas para si mesmas, esses movimentos não se vinculam uns aos outros, resultando em particularismos. Há algum tempo, as manifestações públicas repercutiam em toda a sociedade, chamada assim a delas participar, ativamente ou por consentimento, ao que correspondia a lei entendida como universal, pelo reconhecimento das diferenças das demandas sociais, unificadas, justamente, na lei universalizadora. As mobilizações contemporâneas têm seguidores que se reúnem em comunidades virtuais com sua solidariedade pós-moderna, sem valores comuns admirados e compartilhados por todos.Walter Benjamin caracterizou a modernidade capitalista como “pobreza da experiência” e “experiência da pobreza”, mas nela identificou o novo. Pois essa pobreza “leva a começar do começo, a retomar as coisas desde o princípio, a dar um jeito com pouco, a construir com o pouco que se tem”.

Recorde-se que o movimento que paralisou a França em 1968, de que decorreram desde o movimento de emancipação feminina até a própria democratização das esquerdas autoritárias e de seus partidos centralizadores - encontrando-se na base até mesmo da queda do Muro de Berlim -, teve seu início com estudantes que reivindicavam o direito de visita a suas colegas e namoradas em seus quartos de estudantes.

Razão pela qual os recentes movimentos no Brasil podem constituir o “princípio esperança” do aprimoramento da vida política e do bem-viver em nosso cotidiano.

* PROFESSORA TITULAR DE FILOSOFIA DA USP E AUTORA, ENTRE OUTROS, DE BENJAMINIANAS: CULTURA CAPITALISTA E FETICHISMO CONTEMPORÂNEO (UNESP)

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Deustche Welle - Fillon vai ao Brasil defender venda do encalhado caça Rafale

BRASIL | 16.12.2011

Fillon vai ao Brasil defender venda do encalhado caça Rafale



François Fillon e Dilma Rousseff durante encontro em Brasília
Primeiro-ministro francês se encontrou com Dilma para reforçar a parceria militar com o Brasil, que ainda não decidiu se vai comprar o caça Rafale. Presidente destaca necessidade de transferência de tecnologia.

A preocupação com a defesa nacional está no centro da agenda brasileira. Nesta quinta-feira (15/12), a presidente Dilma Rousseff declarou, em mais de uma ocasião, que o país precisa pensar o reequipamento das Forças Armadas sob o ponto de vista da política industrial.

Durante encontro com o primeiro-ministro francês, François Fillon, a presidente argumentou que os acordos de cooperação com outros países, incluindo a França, devem fazer parte de um modelo de produção nacional.

"Expliquei ao primeiro-ministro que queremos construir uma verdadeira indústria nacional de defesa no Brasil. E as parcerias com a França, em todos os setores, devem se inserir nesse objetivo e na ampliação de nossas capacidades em tecnologia", ressaltou Dilma.

A afirmação faz referência à longa negociação, iniciada pelo Brasil ainda em 2009, de compra de caças para renovação da frota nacional. O Brasil também recebeu propostas da Boeing (Estados Unidos) e da Saab (Suécia), mas o ponto crucial das negociações é a transferência de tecnologia.

"Vim ao Brasil para reforçar nossa total determinação em prosseguir a parceria estratégica lançada em 2008 pelos presidentes Sarkozy e Lula", declarou Fillon.

Sem compradores no exterior

Antes de chegar ao Brasil, Fillon declarara ao jornal Folha de S.Paulo estar confiante de que o negócio em torno do Rafale vai sair. "Nosso melhor argumento é a qualidade das transferências que estamos realizando. Estamos confiantes, porque nossa oferta é a melhor possível", disse.

Os franceses estão tendo dificuldades para exportar o Rafale. Até hoje, nenhuma unidade do caça foi vendida para fora do país. O ministro da Defesa, Gerard Longuet, ameaçou recentemente suspender a fabricação do caça "a médio prazo" devido à baixa procura. As Forças Armadas francesas encomendaram 180 unidades, cuja produção se estenderá até 2018.

Segundo o especialista em relações internacionais Creomar Carvalho, das propostas recebidas, a da França é a que mais apresenta possibilidade de concretizar essa transferência de tecnologia, mas a decisão é complexa.

"O Rafale é um caça muito caro e a transferência de tecnologia não o torna mais barato. Isso gera um certo constrangimento, principalmente com a cúpula da Força Aérea, que não considerou este o melhor avião", afimou Carvalho à DW Brasil. Ele avalia, ainda, que, por outro lado, "a França parece ser o parceiro que teoricamente envolve o melhor custo-benefício na transferência de tecnologia".

Em outro momento, durante cerimônia militar, Dilma voltou a afirmar a importância da renovação nas Forças Armadas. "O robustecimento da indústria de defesa nacional e o domínio de tecnologias críticas por empresas brasileiras serão decisivos para que nossas Forças Armadas disponham de equipamentos e tecnologias compatíveis com suas funções de garantia da democracia e da soberania do nosso país", disse.

A compra dos caças foi discutida durante o encontro com o primeiro-ministro francês, mas o governo brasileiro manteve a posição oficial, adotada ainda no início do ano, de suspender as negociações depois do anúncio do bloqueio de R$ 50 bilhões do orçamento.

Constrangimentos e necessidade iminente

A escolha do vendedor vai trazer muita repercussão, tanto pela concorrência quanto pela resistência natural ao tema, conforme avalia Carvalho. "O gasto com defesa nacional ainda é visto com resistência por vários setores da sociedade brasileira, sobretudo por questões de ranço com o regime militar e outras questões do gênero", ponderou Carvalho.

Apesar da dificuldade que permeia a tomada de decisão, o Brasil não tem muito tempo de sobra, uma vez que hoje as Forças Armadas têm necessidades reais de troca de equipamentos para manter operações de segurança e patrulhamento. As regiões de fronteiras e a região amazônica pedem ações de alto nível técnico que só poderão ser implementadas com a renovação de certos equipamentos, diz Carvalho.

"As armas do crime organizado, por exemplo, passam pelas fronteiras, que são absolutamente porosas. Então precisamos que as Forças Armadas estejam prontas para fazer com que essas fronteiras estejam menos porosas e, a partir daí, criar os atributos necessários para se ter uma linha de frente de resistência ao crime organizado", avaliou.

Relações Brasil-França

Durante a visita do primeiro-ministro francês, os dois países anunciaram alguns acordos de cooperação nas áreas de ciência, tecnologia e educação. Entre eles está o compromisso de aumentar em 10 mil o número de estudantes brasileiros bolsistas na França, até 2014. "A França tem hoje 4.000 estudantes brasileiros bolsistas, e é o país que mais recebe bolsistas brasileiros no mundo", afirmou Fillon.

No âmbito dos investimentos, a França ocupa o quinto lugar entre os maiores investidores no Brasil, tendo sido responsável por 2,3 bilhões de dólares até setembro. O comércio entre os dois países moviment 9 bilhões de dólares anuais.

O primeiro-ministro francês veio ao Brasil acompanhado de três ministros e uma comitiva de cerca de 30 empresários.

Autora: Ericka de Sá, de Brasília
Revisão: Alexandre Schossler

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Deustche Welle - Brasil quer ajudar a Europa, mas impõe condições.

Brasil quer ajudar a Europa, mas impõe condições



'Estaríamos dispostos a fazer as contribuições necessárias via FMI', diz Garcia

País coloca-se como experiente no enfrentamento de crises e dispõe-se a ajudar UE em troca de processo decisório equilibrado. Enquanto isso, governo faz balanço positivo do primeiro ano Dilma Roussef e traça metas.

Inquietação é a palavra de ordem no governo brasileiro no que se refere à crise europeia. A presidente brasileira, Dilma Rousseff, tem demonstrado publicamente que acompanha de perto o desenrolar da crise e as estratégias adotadas pelos países do continente.

"Ela [Dilma] está colocando no centro das preocupações a necessidade que os países desenvolvidos têm hoje de se colocarem de acordo, seja na União Europeia, seja nos Estados Unidos", disse o assessor especial da presidência para assuntos internacionais, Marco Aurélio Garcia, em conversa com correspondentes estrangeiros em Brasília nesta quarta-feira (14/12).

Mas o governo brasileiro está preocupado com as medidas adotadas. "Esperamos que esse acordo recente entre os países da União Europeia, com exceção do Reino Unido, possa dar alguma estabilidade, mas temos dúvidas de que essa estabilidade possa vir se outras questões de fundo não forem atacadas", disse ao comentar a decisão tomada pela cúpula europeia de repassar 200 bilhões de euros até a próxima segunda-feira ao Fundo Monetário Internacional (FMI).

O Brasil, por sua vez, apresenta-se como possível credor. "A posição brasileira no que diz respeito a auxílios é que estaríamos dispostos a fazer as contribuições necessárias via FMI, mas, ao mesmo tempo, acreditamos que essas contribuições devam ser refletidas numa mudança da própria composição da direção do Fundo", alertou Garcia.

Além de inquietação, há um sentimento de temor que ronda o governo brasileiro, que se manifesta em uma dimensão econômica e política. "A Europa é um dos componentes da civilização brasileira e não podemos ficar alheios a esses problemas políticos. Ficamos um pouco inquietos com as consequências que a crise europeia pode ter do ponto de vista do funcionamento do sistema democrático", disse o assessor.

Primeiros 12 meses

A política externa aplicada no primeiro ano do governo Dilma Rousseff seguiu o caminho que havia sido traçado durante os oito anos do governo Lula da Silva. América do Sul e África foram as regiões centrais, mas as ações também destacaram uma participação do Brasil em discussões multilaterais em outras áreas do globo, como na União Europeia e nos Estados Unidos.

Apesar desse papel de destaque em uma agenda prioritariamente positiva, o Brasil também foi foco das atenções do mundo, citou Garcia. Denúncias de corrupção envolvendo ministros levaram à demissão de seis deles. Recentemente, o ministro de Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, tornou-se o novo alvo. Sobre ele caem denúncias de supostas irregularidades em consultorias que prestou entre os anos de 2009 e 2010. A situação do ministro Fernando Pimentel ainda é incerta, tendo em vista a reforma ministerial prevista para janeiro de 2012.

As trocas sucessivas têm sido encaradas como "faxina", mas não é assim que o governo vê a situação. "Esse processo em relação a alguns ministros correspondeu a uma posição do governo de que, diante de denúncias, nós faríamos as substituições necessárias", disse Garcia.

O assessor ressaltou, entretanto, que a demissão de ministros não significa condenação e garantiu que o governo tem mecanismos próprios de apuração de irregularidades. Segundo ele, o saldo é positivo: "São circunstâncias particulares e que tiveram uma percepção muito positiva na sociedade brasileira".

Posições para o futuro

Mudanças internas, principalmente no campo das políticas públicas, nortearam a política externa brasileira nos últimos meses. "Se um país não resolve seus grandes problemas, dificilmente pode garantir uma presença internacional mais sólida. E nós temos hoje uma presença mais sólida que a que tínhamos algumas décadas atrás", comemorou Garcia. Inclusão social e redução das desigualdades estiveram no foco das políticas do governo este ano e deverão permanecer assim no futuro próximo.

O Brasil pretende aumentar a exportação de produtos de valor agregado. Com a recente descoberta de grandes reservas na área chamada Pré-Sal, por exemplo, o país quer ficar entre os quatro maiores produtores mundiais de petróleo.

No âmbito regional, o Brasil tem procurado estreitar os laços para manter o Mercosul distante da crise e mais coeso nas relações comerciais. Segundo Garcia, há, especialmente com a Argentina, uma preocupação em aumentar o conteúdo regional dos produtos industriais: "Em certos setores, como o automotriz, em que a região é muito importante, ainda temos uma dependência muito grande de autopeças".

Garcia complementou dizendo que a América do Sul pretende ter lugar garantido numa nova ordem multipolar. "Queremos resolver os nossos problemas, os problemas da América do Sul, de forma conjunta", conclui Garcia apostando numa posição de maior destaque no cenário internacional.

Autora: Ericka de Sá
Revisão: Roselaine Wandscheer

segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Foreign Policy - The Merkelization of Europe.

The Merkelization of Europe

A European Germany has become a German Europe -- and it's all downhill from here.

BY PAUL HOCKENOS | DECEMBER 9, 2011

Not so long ago, France was the political driver and Germany the economic motor of the European Union. "Now," remarked former European Commission president Romani Prodi in February, it is Merkel "that decides and Sarkozy that holds a press conference to explain her decisions." This searing image could be embellished with the 24 EU members cowering in the press room -- and Britain now watching through the window.


Now that Britain has sidelined itself from the historic "fiscal compact" concluded in Brussels on Dec. 9, which provides the EU with new powers to enforce stricter discipline in national budgets, the community appears even more fiercely segregated within its own ranks. Pathetically, the Brits walked not because of the starkly deficient democratic procedure or the fact these governance changes wouldn't adequately address the euro quagmire, but rather to protect London's financial services industry from regulations that were part of the deal.

This isn't the way European Union was supposed to work, not at all, and Germany's one-woman show -- ostensibly in Europe's name -- could well doom the continent's beautiful project. Merkel may look like the big winner today, seemingly with Europe at Germany's feet, but this turn of events could well prove to no country's detriment more than Germany's.

"The prospect is of a joyless union of penalties, punishments, disciplines and seething resentments, with the centrist elites who run the EU increasingly under siege from anti-EU populists on the right and left everywhere in Europe," wrote the Guardian's Ian Traynor.

Merkel's short-sighted, audaciously Germany-first reaction to staunch the eurocrisis is the Germanization of European monetary and fiscal policy, foremost the codification of its obsession with tight money, fiscal purity, and budgetary orthodoxy. In spite of all evidence to the contrary, she insists that what's good for Germany is good for everybody else, too. It's clearly not. And with the world's leaders begging her to do "whatever it takes" to stave off global calamity, she's doing it with Sarkozy at her side and over the heads of the now completely irrelevant European "voters" ("subjects" is the more fitting word). This is a catastrophic mistake, which, politically, vastly expands the EU's centralized authority while robbing it of even the fig leaf of democratic legitimacy it had sported. Moreover, the economics of Berlin's Germanocentric prescriptions for the eurozone compound the very problems that landed Europe's weaker economies in the mess they're in right now.

Merkel mounts a very high horse when scolding the beleaguered "PIGS" periphery. But her self-righteous fixation with their wasteful ways (which were disastrous, no doubt; imagine if that spending had gone into export-oriented factories or R&D rather than condos or civil servants' pay) and new sets of sanctions and rules to restrain their supposed genetic profligacy doesn't offer a long-term solution. There's not an economist in all of Europe who really believes that dire austerity measures will enable the Greeks, the Irish, or anyone else to pay off their debts.

A few things have to be kept in mind here. For one, it was the one-size-fits-all monetary policy -- nearly identical to the Bundesbank's postwar policies -- that helped make the PIGS so uncompetitive and run up those mind-boggling debts in the first place. These policies also gave the German economy such a lucrative edge on the EU and international markets. After all, while the euro was much harder than the bygone drachma and lira (thus sinking the Club Med's feeble export industries), it was somewhat softer than the old deutschmark, which enabled Germany to boost exports to the PIGS fourfold and to China by a factor of ten during the euro's bony decade. As the Belgian editor-in-chief of a leading news weekly Johan Van Overtveldt argues in his new book The End of the Euro: "Before the euro, the German corporate sector had to invest, push productivity, and innovate constantly to compete with companies in countries that regularly devalued their currencies." The unified currency changed that, much to the satisfaction of Germany's powerful industrial lobby, which still loves the euro for this very reason.

Also, there's yet another level of German hypocrisy in its holier-than-thou protestations concerning the poor periphery's debt. All of Europe is highly indebted and while the European-side of the transatlantic crisis opened on the shores of the Mediterranean, it is now an pan-European crisis -- and that includes Germany, one of the first countries to breach the Maastrict debt ceilings. According to I.M.F. numbers, gross government debt in Germany will be nearly 83 percent of gross domestic product by 2012.

The Germans can't be let off scot-free for what happened. As the Portuguese European MP Ana Gomes recently put it to the Germans: "Our governments, banks, companies and citizens were encouraged to become dangerously indebted by your banks, businesses, your official representatives, and by all who made the euro extremely affordable, at low interest rates, and who encouraged us to procure submarines, cars, equipment and diverse technology we probably did not need. And to buy all of that in Germany, of course." She finished off with a polite but devastating uppercut: "Your budget surpluses, dear German friends, are in fact the mirror image of our deficits."

So rather than try to re-adapt European monetary policy to work a bit better for the traditionally weaker currency countries, the Germans are instead writing into stone the polices best for its economy. It worked for them, so why shouldn't it work for everyone else? As if economies based on tourism, agriculture, and fishing can hope to win by the same rules that enables the world's fourth-largest industrial economy to prosper. As George Soros noted: "Germany cannot be blamed for wanting a strong currency and a balanced budget but it can be blamed for imposing its predilection on other countries that have different needs."

One imbecile of a German politician even openly boasted in November, "Now all of Europe speaks German!" a comment that sent the English tabloids into hysterics, for once understandably. German bullying and blunders like this have fueled the eurosceptic fires in Great Britain that underlay Cameron's subbornness on financial regulation. (In Germany's defense, Merkel's stands don't exude the kind of aggressive nationalism that reeks of the Munich beerhall, as the British tabloids see it, but rather a politics of myopic self-interest for which the next regional election is the long-term perspective.) Anyhow, the Brits have now left the field entirely to the Germans and the French, removing themselves as a possible check to Franco-German hubris. Cameron could have made a principled stand; instead he came away looking the pettiest of them all.

Is there a strategy Merkel has in mind to help get those countries back on their feet again? Simply put: No, and it's not something most Germans care about either, so convinced are they that the lazy Greeks deserve their terrible fate. (For this Merkel, too, is responsible.) Europe-wide, Keynesian deficit spending is not only frowned upon, it is now being outlawed and subject to sanctions. No one's talking about investment in the deficit-strapped countries to relaunch growth and employment, or upping wages or other measures in the north that would reduce trade surpluses and give the south a fighting chance. Bloomberg commentator Matthew Lynn in his excellent book Bust: Greece, The Euro, and the Sovereign Debt Crisis puts it nicely: "To the Germans, telling them to weaken their own competitiveness to help out the eurozone makes about as much sense as insisting that Brazil could play in the soccer World Cup only if they had nine men on the field."

The high-deficit countries are being buried in debt, forced to swallow recession-fueling austerity, and pushed down a path of grinding deflation that will take them decades dig themselves out of. How can their domestic industries or exports possibly bounce back when stuck in this trap? Without the levers of a national monetary policy, with which they could devalue a currency, their only option is to slash and slash wages again until Greece is competitive with Germany (and its own population is completely impoverished and rioting on the streets). As it is, the contraction of their economies will send prices and wages plummeting and joblessness skyrocketing. It will make the debt problems even more severe and there'll be less cash around to repay the balance.

So, what to do if it's impossible to imagine Europe's new crown prince budging on the policies best for it and its northern neighbors? One not-so-loopy idea is to create two currency zones -- a northern and a southern -- the euro for the well-heeled above the Brenner Pass and the "medi" for the western Mediterranean, Central Europe, and maybe Ireland, too. This would have the distinct advantage of preserving the many, indisputable advantages of a currency union, but simultaneously enabling their participants to set money policies and tweak them accordingly in ways more appropriate for their economies. Like the European soccer leagues, under-achievers in the first league could be demoted, while tigers in the lower league could move up.

Another idea along the same lines, but a step further, is "parallel currencies," namely the simultaneous existence of the euro and the whole gambit of national currencies. Both would be legal tender, the euro primarily used, as least at first, as a currency for multinational businesses, the capital markets, and tourists. Eventually, those nations with like-minded economies and policies could adopt the euro as their national money, if they wanted to. But as Lynn underscores "it would happen naturally when the market was ready, rather than being forced on economies that couldn't cope."

Merkel's high-handed and domineering "leadership" could prove even more fatal to Europe than the economic fallout of the currency crisis itself. Sarkozy, like Blair during the Bush years, hopes France will carry more clout alongside mighty Germany than estranged from it. But Paris knows the days of the France-German tandem of the postwar decades are over -- and that it is now the poodle. The whole idea of the euro in the first place was a French ploy to restrain Germany from dominating Europe. Obviously, it backfired spectacularly.

The German agenda has already transformed the European Union into something very different than the supranational confederation that its founders, including its German founders, envisioned for it -- and it can't work this way, even if the severity of the crisis has forced the rest of the club to fall into line for lack of better options. Germany's postwar Europhiles, like Helmut Kohl, saw the EU as a fast track to banish the stigma of Auschwitz and Prussia from Germany's name forever, which would work to its material advantage in a myriad of ways, and indeed it did.

But a "German Europe" (rather than a European Germany) threatens to undo this extraordinarily clever and lucrative strategy, and trigger an anti-Europe reaction that would be in no EU members' interest.

Angela Merkel can't dictate pro-German economic policy to the eurozone, to matter how painful its current agony. Robbing Europe's national parliaments of decision-making powers without popular votes on it is arrogant and authoritarian, and it will create a backlash that could well crash the best idea the Europeans ever made work. But at least now Henry Kissinger has the single telephone number he has long wanted for Europe. It is 49-30-40002526 -- Chancellor Merkel's office.

sábado, 10 de dezembro de 2011

Estadão - Artigo de Ariel Palacios.

Cristina Kirchner: a milionária presidente que prega o “nacionalismo popular”

Este será o segundo mandato de Cristina. Mas, será o terceiro do kirchnerismo. Ou, o terceiro mandato “pinguino”. E será o primeiro mandato de Cristina sem a presença do defunto marido e ex-presidente.
“Um espelho! Quero um espelho!”. O pedido desesperado – em tom de exigência – foi pronunciado em julho de 1982 por Cristina Elisabet Fernández de Kirchner. Ela havia acabado de acordar no hospital de Río Gallegos, capital da província de Santa Cruz, na Patagônia. Uma hora antes havia sofrido um grave acidente de carro do qual salvou-se da morte por um triz. Coberta de sangue, logo que recuperou a consciência, sua primeira preocupação foi seu estado estético. Os médicos e enfermeiras estavam estupefatos.
Quase três décadas depois do acidente, as pessoas que conheceram a atual primeira-dama na época indicam que esse “causo” ilustra bem seu caráter: “vaidosa” e “autoritária”. Assim é Cristina Kirchner, capaz de ter um acesso de fúria por uma marca errada de água mineral colocada em cima de sua mesa ou por uma crítica da imprensa, inclusive com uma caricatura que destaque seus lábios – supostamente – recheados de botox. Os humoristas deliciam-se em ilustrá-la como uma “shopaholic”.
A revista “Notícias” afirmou em seu primeiro ano de governo que era psicologicamente “bipolar”. Seus antigos colegas do Senado reconhecem sua oratória mas a definem como “arrogante”. Mas, Cristina retruca. Ela afirma que as críticas não passam de comentários “machistas” e “misóginos”.
Cristina, a segunda presidente mais rica da América do Sul, com US$ 17 milhões – segundo a declaração oficial de bens, basicamente investidos em imóveis e aplicações financeiras – é uma declarada admiradora de Evita Perón, a “mãe dos humildes”. Cristina, cuja fortuna aumentou 930% desde 2003, define sua política como “nacional e popular”, mais conhecida pela abreviatura “nac e pop”.
Em abril de 2003, pouco após o primeiro turno presidencial, Cristina e seu marido, Nestor Kirchner, receberam o Estado para uma entrevista em seu apartamento no elegante bairro da Recoleta. Ali admitiram que nunca haviam estado no Brasil, a não ser no aeroporto de Cumbica como escala para viagens às americanas Nova York e Miami, únicas cidades que conheciam fora da Argentina. Mas, ao chegar ao poder, Cristina e seu marido transformaram-se em enfáticos defensores da unidade sul-americana e visitaram os países que antes não conheciam.
ADVOGADA - Nascida na cidade bonaerense de La Plata em 1953, Cristina estudou Direito (mas antes havia feito um ano de Psicologia). No curso conheceu um estudante veterano desajeitado, estrábico, que falava com a língua presa e disparava perdigotos. Cristina, que apaixonou-se por ele, salientou que foi cativada por seu senso de humor. O rapaz mal-ajambrado era Néstor Kirchner, que após o golpe de Estado de 1976 a levou para sua terra natal, Rio Gallegos, onde a repressão do regime militar era menor.
Ali, os dois, que haviam militado na Juventude Peronista – embora sem cargos de importância – dedicaram-se ao lucrativo negócio das hipotecas de casas. Durante o regime militar os casal de advogados não assinou hábeas corpus algum em favor de prisioneiros políticos, assunto sobre o qual os Kirchners calam.
Nos anos 80 ele foi eleito prefeito de Río Gallegos, enquanto ela transformava-se em deputada. Quando Néstor elegeu-se governador, ela chegou ao Senado. Durante a presidência do marido participou das decisões mais cruciais do governo.
Em 2007 ela tornou-se a primeira cônjuge na História do mundo a suceder o próprio marido por intermédio das urnas. Até o ano passado o plano do casal era continuar as sucessões alternas de forma indefinida. Mas, a morte de Kirchner, no dia 27 de outubro do ano passado, interrompeu drasticamente o projeto. Cristina, de luto, citando o marido morto em todos seus discursos, fez campanha para suceder a si própria. Neste sábado ela toma posse como presidente reeleita (a primeira mulher reeleita na História da A.Latina).
Este será o segundo mandato de Cristina. Mas, será o terceiro do kirchnerismo. Ou, o terceiro mandato “pinguino”. E será o primeiro mandato de Cristina sem a presença do defunto marido e ex-presidente.
BIOGRAFIAS - Cristina já acumula três biografias best-sellers. A primeira, com o título de “Rainha Cristina”, foi escrita por sua amiga de faculdade, a jornalista Olga Wornat. A segunda, “Cristina, de parlamentar combativa a presidente fashion”, é de Sylvina Walger, que realiza uma ácida anatomia da personalidade da presidente. A última, da jornalista Sandra Russo, que trabalha no canal estatal TV Pública, é “A presidenta. História de uma vida”, livro que elogia a vida e obra de Cristina.
PODER - Cristina assume com um amplo poder conseguido graças aos 54,1% dos votos nas eleições presidenciais de outubro, além de iniciar o novo mandato com maioria – graças a parlamentares próprios e aliados – no Senado e na Câmara de Deputados.
Entre os 24 governadores das províncias, Cristina terá a obediência direta de 19. Dois governadores são aliados permanentes, enquanto que outro, José Manuel de La Sota, de Córdoba, alinha-se com o governo circunstancialmente. Somente os dois governadores restantes – Maurício Macri, do Distrito Federal de Buenos Aires, e Cláudio Poggi, de San Luis – representam a oposição. No entanto, o próprio Macri deixou claro que pretende evitar confrontos com a presidente Cristina.
Apesar do grande poder com o qual inicia o novo mandato, Cristina também herdará do governo anterior – isto é, dela própria – uma série de problemas econômicos cujas soluções adiou ao longo dos últimos quatro anos. No entanto, a equipe econômica permanece praticamente a mesma. Somente muda o ministro da Economia, já que o ocupante dessa pasta, Amado Boudou, será empossado como vice-presidente. Seu sucessor, Hernán Lorenzino, ex-secretário de finanças, é seu homem de confiança.
O novo gabinete é praticamente igual ao antigo, já que a presidente só mudou três de seus 19 ministros.
Cristina destacou que haverá “continuidade do modelo” econômico. Mas, desde as eleições do dia 23 de outubro a presidente deu uma guinada ao afastar-se dos sindicatos – os históricos suportes políticos dos governos peronistas – e aproximou-se do empresariado, com o qual havia tido uma relação de elevada tensão desde sua posse em 2007. Enquanto que os sindicalistas afirmam que sentem saudade de Kirchner e começam a criticar sua viúva, os empresários emitem elogios rasgados sobre a presidente Cristina.
PARLAMENTO PRÓPRIO - Na Câmara de Deputados, a presidente Cristina – que comanda a Frente pela Vitória, uma sublegenda do Partido Justicialista (Peronista) – contará com 115 parlamentares próprios, além de outros 20 aliados. Isto é, ela terá 135 deputados (seis cadeiras a mais do número necessário para o quorum, de 129 cadeiras). Desta forma, encerra-se a fase dos últimos dois anos, quando, depois da derrota nas eleições parlamentares de 2009, o governo Kirchner ficou em minoria.
No total, a Câmara tem 257 cadeiras. Destes, a União Cívica Radical, que nos últimos 60 anos foi a grande rival do Peronismo, terá 41 deputados. No entanto, o partido está dividido entre “moderados”, os simpatizantes do kirchnerismo e um pequeno grupo que opõe-se a qualquer tipo de acordo com o governo.
A Frente Ampla Progressista (FAP), coalizão de centro-esquerda comandada pelos socialistas, que prometeu protagonizar uma “oposição responsável”, terá 22 deputados.
O peronismo dissidente (basicamente os setores conservadores desse partido), reunido na Frente Peronista, contará com 23. O partido de centro-direita Proposta Republicana (PRO) terá 13 parlamentares, enquanto que a Coalizão Cívica, de centro-esquerda, ficará com seis cadeiras. Os restantes 17 deputados de oposição espalham-se em pequenos partidos que oscilam entre a direita e a esquerda. Destes, os partidos provinciais reúnem 13 deputados.
No Senado a presidente também terá maioria. Das 72 cadeiras (para quorum precisa 37), o kirchnerismo contará com 33 senadores próprios, além de cinco aliados peronistas (um total de 38 cadeiras), entre os quais o ex-presidente Carlos Menem. “El Turco” deixou de ser “inimigo” e passou ao status de “colaborador”.
A UCR será a primeira minoria, com 17 senadores. O peronismo dissidente, que sofreu um êxodo de seus integrantes rumo às fileiras kirchneristas, formará um bloco de nove senadores. A Frente Ampla Progressista terá quatro senadores. Outros partidos menores dividirão as quatro cadeiras restantes.

GLOSSÁRIO CRISTINISTA

“Rainha Cristina” – Cristina Kirchner, por sua pose de diva, é chamada “A rainha Cristina”, em alusão ao filme protagonizado por Greta Garbo nos anos 30, no qual interpretava a absolutista e vaidosa rainha Cristina da Suécia. Biógrafos não-autorizados afirmam que ela adora ser chamada de “rainha”.
Presidenta: “Presidenta! Presidentaaa! Que fique bem claro para vocês. É ‘presidenta’”. Desta forma, com dedo em riste e marcando a letra “a” da palavra “presidenta”, a então primeira-dama repreendeu a plateia que participava do comício de lançamento presidencial em julho de 2007 (o público havia gritado em coro “Cristina presidente!”). Só nos primeiros 45 dias de governo, por ordens diretas suas, a Casa Rosada rejeitou mais de 300 documentos em cujo cabeçalho e texto aparecia a palavra neutra “presidente” (com “e” final). Atualmente, todos os documentos ostentam a versão com “a” exigida por Cristina.
“És too much” – “É demasiado”. Expressão que mistura espanhol com inglês usada por Cristina para reclamar de algo. Pronúncia da presidente: “tchúmátch”.
Louis Vuitton – Versace foi a marca no período menemista, já que o então presidente Carlos Menem apreciava as sedas multicoloridas do estilista italiano. Mas, durante o período kirchnerista, a marca – especificamente, com Cristina Kirchner (não Néstor) – passou a ser a francesa Louis Vuitton.
O Pinguim – Apelido de Néstor Kirchner por suas origens patagônias e seu perfil nasal, similar ao da ave polar. Cristina Kirchner é chamada de “La Pingüina” (a Pinguim-fêmea).
A Pinguineira – Refere-se aos mais de 2 mil funcionários de origem patagônia que Kirchner e seus ministros trouxeram à Buenos Aires. O termo também define o círculo íntimo presidencial.
Pinguins “puros” – Aqueles que estavam com o casal Kirchner desde que estes governavam a província de Santa Cruz nos anos 90. São as pessoas de maior confiança da presidente Cristina.
Kirchnerismo: Denominação da corrente política que, dentro do Peronismo, reuniu políticos de diversas tendências. O grupo apresenta-se como “progressista”, embora conte com vários caudilhos que estão no poder há décadas.
Nac e Pop: Nacional e Popular. Definição abreviada que os kirchneristas dão para contextualizar seu movimento político
Estilo K – Estilo de falar sem papas na língua, que também implica em bater primeiro para depois negociar.
Economia K – Termo que define medidas que misturam pragmatismo econômico a curto prazo com tons keynesianos, embalados por políticas neoliberais camufladas. Segundo uns, é “flexibilidade” ideológica. Segundo outros, “oportunismo”. O termo “empresariado K” define os industriais que respaldam sua política econômica, entre os quais diversas multinacionais estrangeiras.
“Él”: Ele. Forma como a presidente Cristina começou a referir-se sobre seu marido Nestor Kirchner após sua morte há um ano.
Cristinistas – Dentro do kirchnerismo, são os seguidores de Cristina. Basicamente jovens ministros, secretários e diretores de estatais cujo poder cresceu com Cristina. Exemplos: o novo vice, Amado Boudou e o novo chefe do gabinete de ministros, Juan Abal Medina.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

TV Brasil - Repórter Brasil: A Crise do Euro Parte II.

TV Brasil - Repórter Brasil: A Crise do Euro.

BBC Brasil - Expansão Econômica da China na AL.

Avanço de exportação chinesa à AL aprofunda laços, mas desafia indústria

Paula Adamo Idoeta
Da BBC Brasil em São Paulo
Atualizado em 8 de dezembro, 2011 - 13:41 (Brasília) 15:41 GMT


Para compensar a queda nas exportações a EUA e UE, China quer vender mais à América Latina
A meta da China de aumentar suas exportações para mercados emergentes como a América Latina é um processo já esperado diante da crise econômica no mundo desenvolvido e traz desafios e perigos para a indústria brasileira, apontam especialistas consultados pela BBC Brasil.
A queda nas exportações chinesas para mercados em crise como EUA e União Europeia fará com que Pequim direcione mais vendas à América Latina e à Ásia, informou o Ministério do Comércio do país na última quarta-feira.



"No ano que vem, acho que enfrentaremos diversos desafios em nossas exportações e importações", disse à imprensa o diretor de comércio exterior do ministério chinês, Wang Shouwen. "Não haverá grandes melhoras na Europa e nos EUA. (...) Mas alguns mercados emergentes e em desenvolvimento estão desfrutando de boas performances econômicas, então vamos dar importância às exportações a esses países."
Para Evaldo Alves, professor de comércio exterior da FGV em São Paulo, o possível avanço das exportações chinesas para o Brasil "apenas acentuaria uma tendência que já é notada há algum tempo".
"Vamos ter mais produtos chineses no mercado brasileiro, mas também vamos exportar mais, porque a China continua com grande dinamismo".
"O lado positivo é a redução do preço de bens industriais (vindos da China) no mercado brasileiro", afirmou à BBC Brasil Creomar de Souza, professor de relações internacionais do Ibmec no Distrito Federal. "O negativo é a grande dificuldade da indústria nacional em acompanhar o ritmo, já que os produtos chineses têm um preço muito mais baixo."
Competitvidade
A competição com os produtos chineses, no entanto, pode ter consequências além do mercado interno. Segundo Souza, os produtos chineses – justamente por causa de sua competitividade – podem tomar mercado da indústria brasileira em locais como México, Argentina e EUA.
A meta chinesa de ampliar mercado na AL é anunciada em momento de retração da indústria brasileira.
Dados de quarta-feira do IBGE apontam que a produção industrial caiu 0,6% em outubro no país em relação a setembro. No comparativo com outubro de 2010, a queda foi de 2,2%.
O comércio internacional em números
Dados do governo chinês apontam que as exportações do país à UE caíram 9% em outubro, em comparação com o mesmo mês em 2010; para os EUA, a queda foi de 5%.
Ainda assim, as vendas externas da China cresceram 15,9%, graças, em parte, à demanda latino-americana.

O Brasil exportou US$ 40,6 bi à China entre janeiro e novembro, 28% a mais que no mesmo período de 2010. Principais produtos: minério de ferro, soja em grão, petróleo bruto
O Brasil importou da China US$ 30,1 bi entre janeiro e novembro (crescimento de 23% em relação a 2010). Principais produtos: aparelhos eletroeletrônicos e componentes, máquinas e equipamentos, químicos e veículos
(*Fonte: Balança comercial brasileira - Ministério do Desenvolvimento)
Ao comentar a estagnação do PIB brasileiro no terceiro trimestre, a Confederação Nacional da Indústria (CNI) afirmou que "o quadro atual é de alerta para o setor industrial".
"Se a piora da conjuntura externa dificulta a já acirrada competição para o exportador, a pressão dos produtos importados, paralelamente, reduz a competitividade da indústria brasileira", diz nota da CNI.
Para Alves e Souza, essa pressão só pode ser aliviada com eficiência industrial e, no que diz respeito ao governo, com a redução de impostos ao setor produtivo brasileiro.
'Poder central e burocracia coesa'
Ao mesmo tempo em que vê perigo na desindustrialização brasileira, o economista e ex-presidente do BNDES Carlos Lessa diz que se preocupa mais com o quadro geral: o que chama de um "avanço colonizador" da China.
"É um país com um poder central e uma burocracia leal e coesa, com planos de longo prazo de domínio (global) semelhante ao da Inglaterra do século 19, mas com mais eficiência", opinou.
"A China quer o celeiro do Brasil (a produção de alimentos e outras commodities) para ela."

Brasil exporta principalmente commodities, enquanto importa produtos manufaturados
A China já é o maior parceiro comercial brasileiro e vendeu ao país US$ 30,1 bilhões – principalmente eletrônicos e componentes, máquinas e equipamentos, entre janeiro e novembro, segundo o Ministério do Desenvolvimento.
Já commodities como minério de ferro, soja e petróleo são os principais produtos de exportação brasileiros para o mercado chinês. Entre janeiro e novembro, essas vendas à China totalizaram US$ 40,6 bilhões, 43% a mais que no mesmo período do ano passado e dando ao Brasil um superavit no comércio bilateral.
Esse superavit deriva principalmente do alto preço das commodities nos últimos anos, que beneficiou o Brasil.
Fazendo uma simplificação da balança comercial brasileira, o país exporta basicamente matérias-primas à China, enquanto importa manufaturados.
Ir além disso é outro desafio da indústria brasileira, apontam os analistas, citando empresas como a Embraer e sua dificuldade em operar no mercado chinês.
"É um mercado onde as leis de patentes não são claras e sem regras de livre mercado", disse Souza, do Ibmec.
Abertura
Em contrapartida, do lado chinês, o pedido é por mais abertura no mercado brasileiro, seja pelo fim de barreiras para a compra de terras ou para a venda de veículos importados (sobretaxados com impostos sobre produtos industrializados).

Crise nos países desenvolvidos força relações mais profundas entre emergentes, diz analista
"Os produtos chineses não são a causa da desindustrialização brasileira. O que causa isso é o 'custo Brasil' (em referência à carga tributária elevada e custos burocráticos)", defendeu Charles Tang, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China.
"O país deveria usar a receita das commodities para combater isso e dar mais competitividade a sua indústria."
Para Evaldo Alves, todos os desafios desse comércio bilateral terão de ser encarados e negociados cada vez mais, "já que essa relação comercial entre Brasil e países emergentes só tende a aumentar, uma vez que a crise (nos países ricos) ainda vai demorar para ser resolvida".