quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Texto de Colaborador.


Mensalão não é novidade e nem o Supremo uma casa de espetáculos
Por: Francisco Lima Júnior.

                        Após alguns contatos que fiz em diversos municípios do país em busca de novidades políticas, ouvi de quase todos os interlocutores quando indaguei sobre a repercussão do julgamento do mensalão naquelas cidades, praticamente a mesma resposta: “ah, meu amigo, aqui estamos mais preocupados é com a eleição de prefeito que está começando a pegar fogo. Mensalão está enchendo o saco na TV, parece até época de natal         ou de carnaval, quando tudo que se divulga tem a ver com a data”.
                        Eu já desconfiara disso aqui no DF, onde não temos eleições este ano, pois já ouvi mais ou menos a mesma resposta a quem indaguei sobre o mensalão.
                        Aí surgem as indagações: o cidadão não está interessado tanto assim com esse julgamento? Será que ele não entende a dimensão desses desvios, das acusações, dos delitos, etc? Claro que entende. Acontece que ao contrário do que muitos afirmam sem o menor fundamento, o eleitor não é bobo. Sabe o que realmente lhe interessa e o que de fato é novidade ou não. 
                     Confesso que resolvi escrever este texto para externar a indignação, minha e de milhares de brasileiros, com a tentativa de parte expressiva da nossa “grande imprensa” em transformar o julgamento do chamado mensalão em um grande espetáculo midiático e o STF em palco para esses shows. Para não dizer desonesto, beira à hipocrisia tal insistência. Prova disso são as consultas que fiz e citei acima. Quem duvidar desse resultado que faça o mesmo com os colegas à sua volta.
                        Ao contrário disso, esses setores da imprensa prestariam um enorme serviço ao país, por inúmeras razões, se apresentassem o mensalão e o julgamento do mesmo como de fato ele é, e de maneira contextualizada.
                        A configuração da nossa cara e jovem democracia não permite outro tipo de governabilidade, senão a de coalizão. Expressão cunhada pelo brilhante cientista político Sérgio Abranches, em seu “O Presidencialismo de Coalizão”, publicado em Veja Online, de 29/novembro de 2000, na seção Em Foco. Lá, Abranches sentencia: “A relação entre o Legislativo e o Executivo tem sido um elemento crítico na democracia brasileira. Somem-se uma agenda de país emergente, uma presidência com amplos poderes, mas que depende de uma aliança entre partidos rivais para governar. Incorporem-se ainda uma federação e a interferência dos governadores na relação entre o presidente e o Parlamento. Tem-se um arranjo complexo, que dificulta decisões rápidas e pode afetar a estabilidade política. É difícil imaginar que um presidente se eleja e seu partido faça a maioria no Congresso. Para enfrentar sua agenda de problemas, todo presidente tem de governar com uma coalizão multipartidária. É o presidencialismo de coalizão”.
                   Mais grave ainda é verificarmos que essa realidade se reproduz na quase totalidade dos municípios e estados do Brasil. Ou você acredita que um prefeito ou governador consegue maioria nas Casas Legislativas de suas esferas de poder, apenas pela vontade dos vereadores e deputados estaduais/distritais em servir à sua comunidade? Infelizmente ainda não chegamos a tais níveis de conscientização. Faça-se justiça: tanto por parte do eleitor, quanto de quem ele elege.
                        Quem não lembra das denúncias da esposa do falecido prefeito de São Paulo, Celso Pitta, de que ele mantinha uma bancada na Câmara Municipal da maior cidade do país, às custas de mesadas que, ainda segundo ela, chegavam até a 120 mil reais? Quem não se recorda do mensalinho do então presidente da Câmara dos Deputados, Severino Cavalcanti? Ou do mais recente, o mensalão do DEM no Distrito Federal? Citei apenas esses exemplos de mensalões para fazer, mesmo que superficialmente, as contextualizações que reclamo da imprensa.
                        Alguns veículos exploram de maneira bastante interessante o julgamento. A competente jornalista do Correio Braziliense, Josie Gerônimo assina matéria de domingo, 5/08, onde revela, por exemplo, os custos desse julgamento para os réus. Despesas com passagens, diárias, e honorários do batalhão de advogados mobilizados superam a casa dos 30 milhões de reais. Interessante notar, ainda segundo a matéria, que este valor é maior que o valor apurado nos desvios do chamado mensalão. Algum outro jornalista poderia explorar, também, o fato de quanto desse dinheiro ficará em Brasília, via restaurantes, taxis, hotéis, etc. Isso sim é assunto novo e relevante.
                        Não estou aqui minimizando os desvios de conduta que alimentam a ciranda dos mensalões Brasil afora. São todos graves, claro. Mas, sim, defendendo que se diga também que isso, lamentavelmente, faz parte da nossa cultura política, que tem melhorado sim, e, mais importante, que esta será a maior contribuição que o STF poderá dar ao final do julgamento. Quem observa com o mínimo interesse e sensatez tem a consciência que dali o menos provável é que saia alguém preso. Mas que penas pesadas, inclusive financeiras, serão aplicadas. Este é o efeito pedagógico que se espera de todo julgamento. Efeito condutor das transformações de uma sociedade.
                        Repito. Independente do peso da pena, esta servirá acima de tudo para ajudar a mudar a consciência de nosso povo. Povo que elegeu os mensaleiros e que somente com lições como essas, contextualizadas e sem as luzes desse show midiático, poderá verdadeiramente entender o nosso país e a complexa arena política da qual ele faz parte.
                        Como bem lembrou o presidente do STF, ministro Carlos Ayres de Britto, em recentes declarações à imprensa, o julgamento do Mensalão é um julgamento como outro qualquer para aquela Corte. E é mesmo. E assim deveria ser “vendido” por toda a imprensa. Afinal, como sabemos o mensalão não é propriamente uma novidade e nem o STF uma casa de espetáculos.
                         
Francisco Lima.Jr., 45, jornalista pós-graduado em Ciências Políticas pela UnB. Professor de Jornalismo Especializado II: Política e Economia(graduação) e de Lobby e Relações Parlamentares(pós graduação) nas Faculdades Icesp, em Brasília-DF.fpaulalj@gmail.com

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