sábado, 10 de julho de 2010

Democracia: Continuidades e Rupturas

Manuais de política, normalmente, estabelecem atributos que qualificam o que seria ou não uma democracia. Neste texto, tentar-se-á entender em alguma medida quando alguns destes atributos podem ser utilizados de maneira a deturpar a percepção acerca do regime democrático. Especificamente, serão tratadas aqui duas perspectivas que compõe o senso comum como elementos importantes de vivência democrática. São elas as noções de continuidade e ruptura.
Para um perfeito entendimento destas duas forças antagônicas em certa medida. Faz-se necessário expor uma definição de democracia para fim de análise. Nestes termos, entende-se por democracia um regime de soberania popular - não diferenciando um regime representativo de outro participativo. Mais do que discorrer acerca desta comparação, o desejo aqui neste momento é de entender como discursos em favor de continuidade ou mudança podem alterar a paisagem política em determinado espaço de tempo.
Seguindo-se a linha argumentativa traçada, entende-se que os regimes de soberania popular - democráticos - tem como ponto fundamental a possibilidade dos cidadãos exporem suas opiniões acerca de assuntos coletivos - política. Desta forma, uma consequência natural de tal situação é que os grupos se situem em posições específicas que visem garantir direitos e interesses em primeira instância individuais, mas, que encontram ressonância em um grupo dado. Tem-se, portanto, como resultado deste processo, a construção de posições antagônicas entre grupos competitivos. Não importando a nomenclatura que se dê a esses grupos - associações, partidos e ou grupos de pressão - é fundamental entender que os mesmos possuem visões consolidadas acerca da realidade. E como tal, essas percepções acabam por gerar opiniões acerca do universo a sua volta que resultam em vontade de mudança/ruptura ou permanência/continuidade.
O posicionamento em favor da transformação ou perenidade pode ser entendido aqui como fruto das benesses que determinado grupo possa estar recebendo da conjuntura social que o cerca. Isto quer dizer: mais do que resultado de um comportamento desinteressado em favor do bem-comum, a vontade de transformar ou manter a realidade está vinculada aos privilégios obtidos por determinada associação e sua capacidade de traduzir esse discurso ao maior número possível de membros da socieade em que a mesma se insere.
No caso específico dos regimes de soberania popular tal posicionamento de continuidade ou ruptura é revisto periodicamente nos processos eleitorais. Nestas situações, cabe aos indivíduos ordinários definirem se querem uma transformação no quadro político ou não. Esse procedimento, que pode resultar em revoluções sem sangue, acaba sendo visto por grupos dentro e fora das estruturas de poder como oportunidades de consolidar posições ou alcançar novos patamares.
A construção do discurso e a tradução do mesmo para as massas é, portanto, tão importante quanto a própria chegada ao poder. A posse das estruturas de mando pode ser encarada como o objetivo final de tal situação. Contudo, é importante refletir em que medida a percepção de continuidade ou ruptura é usada pelos grupos políticos. A questão fundamental aqui é que se os grupamentos políticos possuem discursos mais agressivos em termos dessas posições, os eleitores e ou cidadãos costumam ter posicionamentos mais flexíveis que mesclem continuidade de algumas questões e rupturas em outras.
Tomando-se o Brasil como exemplo, pode-se considerar que no ano de 2002 o Partido dos Trabalhadores atuou como artífice da mudança, mas também, como garantidor da continuidade. Pode-se afirmar, portanto, que quanto mais uma associação tem a capacidade de filtrar os desejos de permanência ou ruptura do povo maiores são suas possibilidades de alcançar e permanecer no poder.
Em termos de funcionalidade do regime democrático casos como o brasileiro reforçam um posicionamento de flexibilização das tendências políticas por parte dos partidos. Tal tendência tem como um dos pilares a dificuldade de consolidação ideológica dos grupos em torno de uma plataforma, mas também, manifestam a vontade popular que é plural.

Um comentário:

  1. Achei muito interessante esse texto pois nunca tinha reparado esse ponto importante da política atual. Mas vejo que a mudança é a "chave" da democracia, como aconteceu no séc. XVIII na França e nos EUA e a continuidade mostra que esse sistema político está funcionando. E talvez seja por esses e outros motivos que a democracia torna-se cada vez mas forte e consolidada.

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