sábado, 12 de março de 2011

CORREIO BRAZILIENSE - DF: Crise Ameaça o Bolso do Brasileiro

Crise ameaça o bolso do brasileiro
Rosana Hessel, Sílvio Ribas

Petrobras segura o preço da gasolina e do diesel, mas já repassa a alta do petróleo para o querosene de aviação e a nafta
Rosana Hessel
Sílvio Ribas
O mundo está assustado com a possibilidade da volta da retração econômica, caso a queda da produção de óleo na Líbia se torne uma realidade nos países com as maiores jazidas, como a Arábia Saudita
A disparada nas cotações internacionais do petróleo começa a pesar no orçamento dos brasileiros. Apesar de não mexer nos preços da gasolina e do diesel, que dependem de autorização do Palácio do Planalto para serem reajustados, a Petrobras já vem repassando o aumento do barril para uma série de derivados, principalmente o querosene de aviação e a nafta petroquímica, insumo básico para a produção de diversos produtos, sobretudo as embalagens plásticas. O querosene e a nafta são revistos, respectivamente, a cada 15 e 30 dias. A situação só agrava o processo inflacionário no país, obrigando o Banco Central a acelerar a alta nos juros básicos da economia (Selic).
Dados da Fundação Getulio Vargas (FGV) mostram que, desde a segunda metade de janeiro, quando estourou a crise no Egito, que se estendeu pela Líbia e vários países do mundo árabe, os preços do querosene de aviação acumulam alta de 7,16%, mais da metade da elevação acumulada em 12 meses: 11,99%. Segundo André Braz, economista da FGV, a tendência é de que o repasse se intensifique nos próximos meses, caso as turbulências engolfem de vez os maiores produtores de petróleo, como a Arábia Saudita, com reservas de 266,7 bilhões da barris. O resultado disso: passagens aéreas mais caras. No caso da nafta, conforme o mercado, o aumento médio ficou em 5% no mesmo período.
Segundo o vice-presidente para a América Latina da Delta Airlines, Nicolas Ferri, a apreensão é grande entre as companhias aéreas, pois o querosene de aviação representa um custo importante para o setor. “Estamos avaliando todos os cenários. O agravamento da crise será muito ruim”, afirmou. Na área petroquímica, há quem fale em reajuste de até 20% nos preços dos produtos a base de nafta. A grande pergunta é se a indústria e o comércio terão condições de repassar tal aumento aos consumidores finais. O problema, reclamam os empresários, é que o encarecimento dos derivados do petróleo veio a se somar a um encarecimento em série das commodities metálicas e agrícolas.
O Brasil é importador regular de querosene de aviação, produto cuja demanda vem crescendo rápido. Em 2010, as importações chegaram a 33 mil barris diários do produto. Quanto à nafta, as importações estão ao ritmo de 39 mil barris por dia. O país também poderá sentir altas nos preços de outros produtos que saem das refinarias, como o óleo combustível usado nas fábricas e pelos navios (bunker).
Ontem, depois de alcançar a máxima de US$ 119,79 em Londres, o barril tipo Brent encerrou o dia em US$ 111,36, com alta de 0,1%. Nos Estados Unidos, o dia foi de muita pressão, diante das tentativas do mercado de descobrir se outros países podem compensar a queda da produção líbia. Na New York Mercantile Exchange (Nymex), o barril de West Texas Intermediate (WTI) para entrega em abril fechou a US$ 97,28, em baixa de 0,9%. Segundo Tom Bentz, do Banco BNP Paribas, o recuo se deu depois que a Arábia Saudita garantiu que suprirá a redução da produção da Líbia. Em julho de 2008, o valor do barril do Brent chegou a US$ 147, mas, no fim daquele ano, após a quebradeira de bancos e de várias economias, inclusive europeias, recuou para US$ 37.
Especulação
Vários operadores alertaram para os movimentos especulativos no mercado com o óleo. “Há muita distorção tanto no preço do petróleo quanto nos das commodities agrícolas. Tem muito investidor comprando contratos de petróleo só para aumentar a demanda e obter lucros no curto prazo”, alertou o economista da Prosper Corretora, Demetrius Borel Lucindo. Ele ressaltou ainda que, ao manter o preço da gasolina 4% abaixo do praticado no mercado externo, a Petrobras já acumula perdas superiores a R$ 200 milhões.
Para José Luís Oreiro, professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB), mantida a escalada do preços do petróleo, o risco de uma nova recessão global é grande. É que a inflação tenderá a subir, obrigando os bancos centrais a elevarem os juros, abortando a ainda frágil recuperação econômica dos Estados Unidos e da Europa. “O risco de uma nova recessão é considerável ainda neste começo de ano por, pelo menos, dois trimestres seguidos”, disse.
Na avaliação do diretor de Relações Internacionais da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Thomaz Zanotto, é cedo para fazer estimativas. Mas os empresários estão atentos para a crise política, sobretudo na Líbia, grande fornecedora de petróleo para a Europa. “Se ela continuar, o risco de uma recessão acompanhada de inflação (estagflação) no mundo é muito grande, e isso seria o pior cenário possível”, destacou. (Colaborou Gustavo Henrique Braga)
Em Nova York, tensão em torno da cotação do barril afeta investidores
Pressão sobre BCs mundiais
Começam a ser divulgadas as primeiras estimativas de impacto da alta dos preços internacionais de petróleo na inflação, jogando a pressão dos reajustes nas taxas básicas de juros pelos bancos centrais. Segundo a consultoria Fathom, se o preço do barril tipo Brent estacionar em US$ 120, a taxa britânica de inflação ganharia 0,48 ponto percentual. Nos Estados Unidos e na Europa, o acréscimo seria respectivamente de 0,51 e 1,63 pontos. Mas, caso o patamar seja de US$ 150, o impacto iria ao dobro. Analistas internacionais veem um sério dilema para os governos dos países desenvolvidos: de um lado, a tentativa de evitar a disparada dos preços domésticos; do outro, a busca da retomada do crescimento.
Medo de uma nova recessão
Os mercados internacionais continuaram repercutindo ontem o medo de que os tumultos nos países árabes interrompam a incipiente retomada da economia global. As altas recordes nas cotações do petróleo ampliaram as incertezas, especialmente sobre Europa e Estados Unidos, altamente fragilizados por problemas fiscais e ameaças inflacionárias.
As principais bolsas do mundo registram o quarto dia de perdas. No Brasil, as ações ordinárias (com direito a voto) da Petrobras recuaram 1,82% e as preferenciais, 1,18%. A pressão foi reduzida no fim do pregão, deixando para trás os picos recordes desde agosto de 2008. Outras nações produtoras foram indicadas para compensar perdas de produção registradas na Líbia. Os investidores esperam resposta da Arábia Saudita, principal produtora na Organização de Países Exportadores de Petróleo (Opep). Os sauditas já conversam com refinadores europeus.
Para tentar administrar expectativas negativas, a Agência Internacional de Energia (AIE) afirmou que, até agora, apenas 750 mil barris diários – menos de 1% do consumo global – foram tirados do mercado em razão da crise. Um dia antes, porém, o próprio organismo afirmou que as altas do petróleo ameaçavam a recuperação de economias desenvolvidas e emergentes. A AIE tem 1,6 bilhão de barris de reservas petrolíferas de emergência à disposição para momentos de crise.
Cenário
A Casa Branca também reforçou a ponderação, anunciando ter capacidade para agir em caso de uma grande interrupção no abastecimento de petróleo provocada pelos confrontos no Oriente Médio. Os estoques de petróleo nos EUA subiram 822 mil barris semana passada, para 346,74 milhões de unidades.
Aliada à queda na oferta do produto, devido a uma perpetuação da suspensão da produção da Líbia, a alta nos preços poderá desencadear nova crise, analisou o professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Helder Queiroz. Já para o analista político do Ibmec-DF Creomar Lima Carvalho de Souza uma crise econômica será provável se o petróleo continuar a subir. “A Líbia responde por 15% da demanda de petróleo da Europa. Se a energia ficar cara, a economia vai reagir mal”, avaliou. (RH e SR)
Kadafi faz ameaça
Importantes terminais petrolíferos da Líbia localizados a leste de Trípoli estão sob o controle de rebeldes contrários ao presidente Muamar Kadafi, disseram moradores de Benghazi que conseguiram fazer contato com pessoas na região. O ditador líbio disse que essa ocupação reduzirá a oferta de petróleo no mundo. Por ora, os volumes exportados pelo país permanecem próximos da normalidade.

Nenhum comentário:

Postar um comentário